O Melhor da Música Brasileira de 2024

 


Seguem os álbuns brasileiros que mais me cativaram em 2024:

 

Felipe Lara - Portals

Às vezes, precisamos apenas nos deixar levar pelas sonoridades de instrumentos europeus tradicionais, permeados por uma série de inovações composicionais dos séculos XX e XXI; ou seja, da “música contemporânea raiz”. Felipe Lara surgiu do nada pra mim, enquanto ouvia os álbuns de brasileiros disponibilizados na Loja Clássicos. Lara é um compositor e professor com carreira de peso nos Estados Unidos (inclusive finalista do Prêmio Pulitzer de 2024), e sabe conduzir muito bem o ouvinte por trajetórias contemporâneas, sem nunca resvalar no raso ou no banal. Em Portals, o Talea Ensemble (regido por James Baker) e o pianista Conrad Tao interpretam a música de Lara com toda a alma e competência técnica.

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube



 Gimu - The Loneliness of Carers

Entre 2010 e 2022, Gimu lançou 64 álbuns e EPs, alguns em parceria, e muitos lançados em formato físico (CD ou K7). No final de 2024, após um hiato de mais de dois anos, o artista nos presenteou com o eletrizante The loneliness of carers. Segundo o texto de lançamento, disponível na página de Bandcamp da Confusão Records, a temática é a da “solidão sentida no ato de abdicar de si para cuidar do outro” - entretanto, cabe pontuar que não se trata de música cantada. Para quem não é acostumado com a música ambient e drone, o álbum soará estranho. Para quem não é do noise, como eu, algumas faixas serão ruidosas demais. De toda forma, este registro traz momentos memoráveis, flechadas certeiras no coração, com títulos tocantíssimos: I dragged you into the tunnel at the end of the light, I remembre fun e The self exile of the self. O fechamento do ciclo se dá com For your volcanoes, love, um lamento sofrido com mais de 20 minutos de duração.

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

Igor Colombo - Saudade Solar

Saudade solar, de Igor Colombo, é um álbum grandioso e variado. Infelizmente, por não estar aliado a nenhuma linha musical da grande mídia ou das mídias alternativas, ficou restrito a um público seleto. Já realizei uma resenha longa e pormenorizada sobre o registro, do qual destaco os seguintes tópicos: (1) apresenta uma temática tocante e complexa sobre a morte de uma pessoa amada, em um caldeirão de sentimentos e referências da música brasileira; (2) conta com um time espetacular de músicos; (3) abundam referências de ausência, melancolia e fragilidade, mas também de esperança; (4) é musicalmente e poeticamente refinado. Não adianta tentar explicar muita coisa, apenas desfrute das 12 faixas em sequência e deixe que a música fale por si. Por fim, cabe ressaltar que Igor é meu irmão, e compartilha comigo muitas preferências musicais; estas são aqui levadas a altos níveis de expressão, graças à genialidade do artista.

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

Sérgio e Eduardo Abreu - The Guitars of Sérgio and Eduardo Abreu (1971) [Relançamento]

Originalmente lançado em 1971, o segundo álbum dos irmãos Sérgio e Eduardo Abreu já havia sido gravado dois anos antes. Neste registro, um dos melhores duos de violão da história apresenta um repertório elegante e variado, com rara musicalidade, sonoridade e fluência. A GuitarCoop já havia lançado oficialmente o álbum BBC Recital 1970, que há muitos anos era compartilhado de forma não-oficial, e agora nos presenteia com esse primeiro relançamento de um álbum de época do duo, após mais de 50 anos. Se eu pudesse indicar uma única gravação que representasse o que há de melhor no violão clássico, escolheria a gravação, por Sérgio e Eduardo Abreu, da Tonadilla de Joaquín Rodrigo, presente nesse álbum.

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

Seguem os álbuns brasileiros com conteúdo explícito que mais me cativaram em 2024:

 

Crizin da Z.O. - ACELERO

ACELERO, de Crizin da Z.O., é favela funk industrial e experimental, com toques de thrash metal e música de terreiro. Todo o álbum é bastante envolvente, e nos apresenta letras muito intensas e reflexivas: (1) “É o mundo se acabando / Junto com o fim da linguagem” (em O fim um, com participação de Iggor Cavalera); (2) “Eu não vou ficar aqui / Esperando tudo explodir, explodir” (em Calmo apesar de tudo, com participação de Saskia); (3) “Tenho pensado muito sobre território / E como eu me comporto em cada território” (em Território); (4) “Pode perguntar no privado pra qualquer um / Ninguém tá acreditando no século XXI” (em O fim dois); (5) “Eu vi um drone voando em cima do meu quintal / Imaginei acoplado com duas ParaFAL / Pra que que serve essas coisas se não pra fazer o mal? / Eu perguntei pra inteligência artificial” (em Pacote de dados).

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

DJ Anderson do Paraíso - Queridão

A lista de melhores discos do ano do site Boomkat abarca a música underground, experimental e eletrônica de diversos países. Qual não foi a minha surpresa quando vi que o 2º álbum da lista de 2023 era Queridão, que só sairia oficialmente em março de 2024! O mineiro DJ Anderson do Paraíso lançou esse seu álbum - na verdade, uma coletânea de músicas do artista - pela gravadora ugandense Nyege Nyege Tapes. A temática das letras é a da putaria heterossexual centrada no homem, o que é típico do gênero, mas o som, ao invés de caótico, é introspectivo, sombrio, pontilhista e permeado pelo silêncio; o choque entre a sonoridade e o teor das letras é espetacular; e dentre os MCs, há uma quantidade considerável de mulheres. Por fim, cabe ressaltar que o artista também lançou, em 2024, um álbum curto com oito músicas novas: Paraíso sombrio.

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

Maria Beraldo - Colinho

Demorou algumas décadas para que surgisse no cenário alternativo brasileiro alguém como Maria Beraldo: artista e musicista extremamente competente, com muito bom gosto e criatividade, e muito firme no propósito de se expressar visceralmente, doa a quem doer. Seis anos após o fenomenal Cavala, a artista retorna com um álbum ainda mais provocativo e variado. Clarinetista e acadêmica, a artista desvela, de forma crua e poética, diversos pormenores da sua existência, especialmente relacionados à sexualidade. No registro, vertentes da música eletrônica mais alternativa se chocam com pianos de free jazz (na faixa título), ao passo que cordas friccionadas ultra dramáticas e expressionistas (em Ninfomaníaca) e momentos folk (Matagal, com participação de Zélia Duncan) contrastam com momentos dançantes (Truco), composições complexas (Guma e Quem eu sou) e baterias inconstantes (Crying now). Há espaço também para uma faixa extremamente grotesca que passa longe do ridículo (I can’t stand my father anymore) e um samba atemporal e extraordinário cantado com o coração (Minha missão).

Clique aqui para ouvir o álbum completo no YouTube


 

Seguem as músicas brasileiras que mais me cativaram em 2024:

 

Duda Beat - Na Tua Cabeça

Quem no Brasil precisa do álbum Brat, de Charli XCX, se temos Tara e tal, de Duda Beat, lançado no mesmo ano? É música para as pistas, da melhor qualidade. Não sou um cara que se deixa levar pela música pop, mas Na tua cabeça, com seus tons jazzísticos e refrão irresistível, não saiu mais da minha cabeça.

 

Nicolas Geraldi - Sempre Há

Sempre há, de Nicolas Geraldi, é simplesmente a canção psicodélica que os brasileiros ainda não aprenderam a fazer no século XXI.



Texto revisado por Gisele Guion
Crédito da Imagem: Texto em Canva
Publicado também no Caderno de Cultura da Pressenza International Press Agency / Trechos publicados no site Bolsa de Discos e também anteriormente neste blog

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Igor Colombo - Doce Terra

Os 5 Discos Nacionais Mais Bizarros da Década de 2000 – Introdução

O Melhor da Música Não Brasileira de 2024